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Foto do escritorOlga Curado

Tu pertences, eu pertenço, nós nos pertencemos

A imagem emblemática de um Papa celebrando na Praça de São Pedro, em Roma, a missa pela misericórdia de seu Deus pelos filhos assustados com a pandemia do novo Corona vírus, diz muito sobre a importância de nos reconhecermos com parte da mesma tripulação e passageiros de um único barco, assim como disse Bergoglio.vv


O sentimento de solidão, que muitas vezes se confunde com autossuficiência vaidosa de nós que nos sentimos e reconhecemos como poderosos, melhores, mais ricos e mais talentosos que os outros, pode ser substituído pela ação propositiva de ajuda, de apoio aqueles mesmos outros que desprezamos ou ignoramos, tão cheios da nossa própria importância.


Essa quarentena está me oferecendo a oportunidade de me observar e ao fazer isso perceber melhor o que também o outro entrega. A tentação por entrar numa espiral de conversas de vitimização, autocomiseração e falsas generosidades, com fala de empatia, nada mais que a projeção do egoísmo , afinal de contas estamos sem o acesso temporário a tantos benefícios que os párias da sociedade – aqueles aos quais nos acostumamos a usar- dando-me conta da falta que faz a roupa passada e dobrada, o chão limpo, a comida a gosto e a abundância sem esforço nas prateleiras dos supermercados.

Falo de nós, de uma elite que não se enxerga com privilégios, mas com direitos que não sente a necessidade de compartilhar. Quanto aos outros que não fazem parte do clube, bem, as coisas são assim mesmo. Não se pode dar tudo a todos, não há de tudo para todos. Naturalmente o tudo de cada um é muito mais que o essencial da grande maioria.

Não quero fazer um exercício de culpa, inspirada pelo calvário que agora é lembrado nessa quaresma de quarentena. Trocar a culpa por responsabilidade significa ter gestos que medem as consequências dos próprios atos. Movimentos que não nos acostumamos a enxergar, e quando vistos nos cartazes das manifestações de protestos de meninos e meninas, de homens e mulheres em praças ainda vazias, apontamos com desgosto - são gritos de histeria. Quem pode imaginar que se derreta uma calota solar, que desapareçam animais aos quais nos acostumamos ver, e que águas aquecidas inundem as cidades e as façam desaparecer ?

Também me dou conta da dificuldade da implementação de uma nova paradigma que inclua os excluídos, que aceite o diferente, que respeite a dor que não sentimentos na nossa própria pele. A rotina da esquiva, como maneira de se preservar é a maneira mais dissimulada para não agir.


Durante quase vinte anos treino Aikido. A arte marcial japonesa fundada pelo mestre Mohirei Ueshiba pelos anos de 1930 cujo princípio estruturante é o estabelecer a conexão com o outro unindo-se a ele, contrariando a ideia de domínio sobre o outro, corrente nas práticas marciais que visam a vitória.


Esse ensinamento agora se mostra mais prático do que nunca. Do meu mestre de Aikido Motomichi Anno, na sabedoria dos seus 90 anos de idade, quase setenta deles dedicados ao Aikido na remota cidade de Shingu, na Baía de Kii, extremo sul do Japão, ouvi o conselho quando anunciei meu desejo de ensinar a arte.” -Siga o caminho do seu coração, me disse- e não se preocupe em saber tudo.

O que pode parecer um slogan de auto ajuda esconde na realidade um sentido oculto. Não se trata de obediência aos impulsos do coração, como se a sabedoria estivesse lacrada nos desejos pessoais. É sim a compreensão do simbólico órgão que se expande e contrai para nutrir todo o organismo. Tudo conta

Ninguém fica de fora. Se alguém é excluído, todos morremos. E aqueles que querem se excluir , - ficando de fora , sem doar um mínimo de si, numa palavra de conforto ou de apoio, numa escuta, ou em um gesto de atenção, e também oferecendo o que neste momento não faz falta – sem temer a falta que faria no futuro – definharão na sua própria avidez.

Todos nos pertencemos. Esse é um direito que garante a vida.

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