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Foto do escritorOlga Curado

A lógica da virulência


As coisas acontecem por algum motivo.


O mistério por detrás dos acontecimentos é a fonte primária das fantasias e dos pensamentos mágicos, até que a revelação dos motivos, as razões fiquem explicitas.


Hoje, em isolamento consentido há mais de 5 semanas observo que a pandemia provocada pelo novo vírus encontra aliados em gerar novos desastres. Se o vírus – que nem sequer é um ser – mas como informou um cientista – é um detrito de um ser, que em contato com a vida se torna dono de quem o hospeda.


Ao lado da pandemia e acima dela o país é açoitado pelo desastre da desinformação, da má informação, da tentativa de impor o caos. Fica a perplexidade da indagação primária. Por quê? Você pode estar imaginando que estou falando das lideranças políticas do país – e estou sim. Pode até pensar que estou falando do Presidente da República e dos seus acólitos, pois acertou.


A motivação do novo corona vírus é uma só – seguir, tornar-se vivo – e o preço é a contaminação de milhares, de milhões de pessoas. O vírus até se sacrifica pelo seu objetivo quando se instala vorazmente num organismo exaurindo-o à morte, e ele, o vírus, indo junto. Porém isso não o intimida. Há que morrer alguns, até dezenas de milhares de vírus para que ele se perpetue em milhões.


À moda do novo corona assisto e me autorizo comentar - a expressão de gestos de desvario, que não são de loucura ( a insanidade é atenuante) são de maldade. Hannah Arendt imortalizou o conceito da banalização do mal. A prática genocida da Alemanha de Hitler coisificando as pessoas, tornando-as objetos de tortura e de dizimação numa prática em que a sua humanidade é negada, é um raciocínio que parece amparar o vírus da tirania necrófila .


Projeta-se ele, esse vírus sádico, sobre a sociedade como um Nosferatu, a vociferação de um prazer sórdido e oligofrênico na negação da vida e no desafio aos fundamentos da democracia. Que morram as instituições! brada o ser que emerge das sombras .É o preço cobrado por esse vírus na tentativa da própria imortalidade.


Muito além das ideologias - das escolhas de modelos econômicos, de regulações dos serviços e da produção; muito além do debate sobre contas públicas e de preferências partidárias, muito além das nuances de cores e das catarses das disputas políticas, está o caráter humano.


A banalização do mal que se testemunha , pela aceitação pacífica e indiferente à morte de muitos, como preço inevitável – numa conta justa para os sobreviventes – ; o desregramento do comportamento institucional, que se justifica com o brado “Je suis la Loi, Je suis l'Etat; l'Etat c'est moi"(Eu sou a Lei, eu sou o Estado; o Estado sou eu!) numa caricatura à fala atribuída ao Rei Sol Luiz XIV que governou a França de 1643 a 1715, crente nos seus poderes divinos, sem antever a destruição do regime ainda no século XVIII - são os recursos do vírus do autoritarismo.


Mais visível que o novo corona, aquele vírus do autoritarismo paranoico tem similar capacidade destrutiva. Conta com a omissão do venerável público e também com os debates distrativos da falsa polarização que cria dilemas assentados em factóides , como se vida humana e o viver se excluíssem. Corrói, esse vírus, a capacidade de olharmos o outro como seres humanos, de traduzir mortes em estatísticas e transformar instituições de Estado em teatro de marionetes , para distração de muitos e proteção de alguns.


A ética é uma diretriz das escolhas individuais – ou em apreço a um grupo. O caráter é a marca que brota daquelas escolhas. O vírus da Covid-19 tem a ética da vida a qualquer custo, o seu caráter é o invisível e avassalador apetite.


Qual a razão desse vírus que alega legitimidade para promover um festim diabólico – lembrando que o ato diabólico é o que promove a separação, a discórdia. Ele tem a razão de todos os vírus, perpetuar a si mesmo pela fragilização do outro, em que passa a imperar. Mas se renderá se a inoculação do seu veneno ao nos contagiar, não nos imobilizar. Será destruído pela vital e imperiosa manifestação de todos que não aceitam a banalidade do mal. Vai ser arredado pelo grito de quem não coonesta com as tentativas de destruição das instituições do Estado.


Apenas com o coro dos democratas, com o canto dos que não aceitam o ódio como base das relações humanas, com grito destemido dos que não se acovardam com o ruído do bombardeio às instituições , esse vírus será expelido. O vírus do autoritarismo tem medo do barulho das democracias e irá devolver aos esgotos a lógica da virulência.

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